EMBARGOS – Documento:6669621 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0018034-24.2007.8.24.0005/SC RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA RELATÓRIO Trata-se de embargos de declaração opostos por A. H. P. ao acórdão que, por unanimidade, conheceu do agravo interno interposto pelo réu/apelante e deu-lhe provimento, sob a seguinte ementa (evento 74, ACOR2), verbis: AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. INCONFORMISMO COM A DECISÃO UNIPESSOAL DO RELATOR QUE REJEITOU O PEDIDO DE SUSPENSÃO DO ANDAMENTO DO FEITO. AGRAVO INTERNO DO APELANTE/RÉU. ALEGAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE A AÇÃO REIVINDICATÓRIA C/C ANULAÇÃO DE SENTENÇA, CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO E a AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO POSTERIORMENTE PROPOSTA. ACOLHIMENTO. AÇÃO ANULATÓRIA FUNDADA NA SUPOSTA VIOLAÇÃO À LEGISLAÇÃO QUE REGULA A AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS POR ESTRANGEIROS NÃO RESID...
(TJSC; Processo nº 0018034-24.2007.8.24.0005; Recurso: EMBARGOS; Relator: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA; Órgão julgador: ; Data do Julgamento: 19 de dezembro de 2006)
Texto completo da decisão
Documento:6669621 ESTADO DE SANTA CATARINA TRIBUNAL DE JUSTIÇA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0018034-24.2007.8.24.0005/SC
RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
RELATÓRIO
Trata-se de embargos de declaração opostos por A. H. P. ao acórdão que, por unanimidade, conheceu do agravo interno interposto pelo réu/apelante e deu-lhe provimento, sob a seguinte ementa (evento 74, ACOR2), verbis:
AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. INCONFORMISMO COM A DECISÃO UNIPESSOAL DO RELATOR QUE REJEITOU O PEDIDO DE SUSPENSÃO DO ANDAMENTO DO FEITO.
AGRAVO INTERNO DO APELANTE/RÉU.
ALEGAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE A AÇÃO REIVINDICATÓRIA C/C ANULAÇÃO DE SENTENÇA, CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO E a AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO POSTERIORMENTE PROPOSTA. ACOLHIMENTO. AÇÃO ANULATÓRIA FUNDADA NA SUPOSTA VIOLAÇÃO À LEGISLAÇÃO QUE REGULA A AQUISIÇÃO DE IMÓVEIS RURAIS POR ESTRANGEIROS NÃO RESIDENTES NO BRASIL. FUNDAMENTO QUE, SE ACOLHIDA A TESE, PODERÁ ENSEJAR A NULIDADE NÃO APENAS DA DOAÇÃO REALIZADA, MAS TAMBÉM DA AQUISIÇÃO DO IMÓVEL PELO DOADOR. CARACTERIZADA A RELAÇÃO DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA COM A AÇÃO REIVINDICATÓRIA, NA MEDIDA EM QUE A EVENTUAL PROCEDÊNCIA DA ANULATÓRIA PODERÁ DESCONSTITUIR O TÍTULO DOMINIAL QUE SUSTENTA A PRETENSÃO DO AUTOR DA REIVINDICATÓRIA.
AGRAVO INTERNO CONHECIDO E PROVIDO.
Argumenta: a) "Fugindo do que foi requerido no pedido original, no agravo interno o Embargado utiliza a suposta nulidade da aquisição da propriedade pelo Embargante como razão de mérito para pleitear a suspensão, o que configurou inovação em relação ao que foi formulado anteriormente [...] houve omissão quanto a este argumento trazido em contrarrazões, o que obviamente exige seja sanado pela relevância do argumento e pela precedência de decisões a agasalhar a tese invocada"; b) "o acórdão fez uso de alegações contidas no agravo interno, notadamente as legislações não invocadas antes da formulação do pedido de suspensão, utilizando-as como razão para concluir pela existência da aventada prejudicialidade entre as demandas. Resta evidente a obscuridade, a falta de clareza, de inteligibilidade, pois o tema que deveria determinar o não conhecimento do recurso foi utilizado para fundamentar a reforma da decisão monocrática antes prolatada, modificando-a em favor do pleito do Embargado. Violou-se, desta forma, o contido no art. 932, III, do CPC, o qual deve ser considerado prequestionado, que atribui ao relator a incumbência de não conhecer do recurso inadmissível. Há de ser reconhecida a omissão na decisão embargada, portanto, a fim de reconhecer que o agravo não poderia ter sido conhecido pelas razões que justificaram seu provimento, diante da patente inovação recursal"; c) "A decisão embargada, ao justificar a repentina alteração de posição com relação à decisão monocrática que indeferiu o pedido de suspensão do feito, aduziu que os argumentos lançados na outra demanda poderiam impactar não só na nulidade da doação de A. H. P., o pai, para seu filho, A. H. P. Junior, como também na aquisição originária do imóvel por Albert pai [...]. A afirmação transcrita traz ao processo uma questão que não é tratada na ação em trâmite no primeiro grau de jurisdição, o que igualmente torna confuso o decisum que reformou a correta decisão anteriormente prolatada. 18. Isto porque, com a devida vênia, o acórdão parte de uma equivocada premissa de que também a aquisição do imóvel por A. H. P. estaria sendo objeto de análise na ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005. 19. Isto não corresponde à realidade processual, uma vez que a pretensão se dirigiu à anulação da doação feita por ele (A. H. P.) em favor de A. H. P. Junior, seu filho. Mas em nenhum momento questionou a aquisição original!" d) "o pedido de suspensão objeto do Agravo Interno (Evento 46) baseia-se em suposta nulidade da escritura de doação: É cristalino que não há qualquer menção a uma suposta nulidade da aquisição do imóvel por Albert pai. Isso não é mencionado nem nos pedidos, nem na causa de pedir daqueles autos, ou seja, uma eventual declaração de nulidade da aquisição originária pelo doador do imóvel tornaria a sentença daquela ação extra petita, pois lá se busca tão somente a nulidade da doação operada em favor do Embargante e, posteriormente, da compra e venda em favor de Haroldo Ribeiro de Faria Junior e Caroline Aparecida Jasper Ribeiro de Faria. Esta premissa equivocada fez com que Vossa Excelência refluísse no seu entendimento inicial quanto à ausência de prejudicialidade entre a presente demanda e aquela, pois passou a refutar a sua conclusão de que a nulidade da doação apenas faria com que o imóvel retornasse ao espólio do doador, cujo representante é justamente o Embargante, assim sua legitimidade ativa para ter proposta esta demanda não seria afetada. Agora, por Vossa Excelência considerar que também poderia ser declarada nula a aquisição por Albert pai, logo o Embargante não teria legitimidade nem mesmo na condição de representante do espólio. Ocorre que qualquer decisão que fosse prolatada nesse sentido, isto é, que implicasse na anulação da aquisição original, não se mostra juridicamente possível, uma vez que não é objeto de nenhuma das demandas judiciais! Trata-se, portanto, de evidente obscuridade quanto à possível extensão dos possíveis efeitos da futura sentença da ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005, o que determinou erroneamente fosse considerado no acórdão a existência de prejudicialidade entre as demandas. Esta evidente incorreção impactou diretamente na conclusão do acórdão quanto à possibilidade de suspensão da presente demanda, o que torna imperiosa o suprimento da obscuridade"; e) "Para além do evidente erro de premissa exposto no tópico anterior, o Embargante sustentou já nas contrarrazões ao agravo interno os argumentos pelos quais não se poderia concluir por uma relação de prejudicialidade da presente demanda com a ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005, e nenhum desses argumentos foi analisado no julgamento do recurso [...]. A inexistência da prejudicialidade fica evidente pela constatação de que eventual procedência da ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005, o resultado prático desta decisão seria o retorno ao status quo ante, ou seja, a propriedade voltaria para A. H. P., falecido em 06/02/1986. Nesse sentido, o imóvel retornaria a pertencer ao espólio de Albert, que, por uma questão lógica e obedecendo à legislação que trata das sucessões, seria representado por seu herdeiro, o ora Embargante [...]. Repete-se, portanto, ser absolutamente ausente a ocorrência de prejudicialidade entre as demandas, pois o resultado almejado na referida ação seria inócuo tanto para Aujor como para o Espólio de Valentin, na medida em que não traria qualquer alteração nos direitos de Albert Jr. quanto à herança sobre o imóvel, posto ser o natural sucessor de seu pai no exercício da propriedade. Logo, independentemente do resultado da ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005, não há impacto da futura sentença daquele processo sobre a presente demanda, a qual não depende do julgamento daqueles autos, o que afasta a hipótese do art. 313, V, “a”, do CPC"; f) "Houve, anteriormente, a adoção do raciocínio referente à inocuidade de uma decisão de anulação da doação em relação à propriedade primitiva de A. H. P., como afirmado pelo eminente Relator. 35. Registre-se ter esse raciocínio utilizado em duas oportunidades, a saber: quando do julgamento do agravo de instrumento n. 5036464-89.2023.8.24.0000 e, posteriormente, na negativa ao pedido de suspensão do andamento da apelação cível n. 5005386-62.2023.8.24.0005, havida em decisão monocrática nestes autos (Evento 40). Mais que a reformulação do entendimento, resta clara a contradição ao serem refutadas decisões prolatadas em sede de julgamento de agravo de instrumento como em decisão monocrática, mormente pela utilização de matérias que sequer poderiam ser conhecidas, conforme exaustivamente exposto. Por fim, cabe destacar novamente que a ausência de prejudicialidade também é evidenciada pelo fato de a ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005 ter sido proposta unicamente por A. F. S., e o pedido de suspensão foi feito unicamente por Espólio de Valentin, que sequer é parte naquela demanda. Ora, o que justifica não ter sido Aujor, seja nestes autos ou nos referentes à outra demanda quem pediu a suspensão, sendo aquele que é diretamente interessado no resultado da nova ação? Isso evidencia que, em verdade, o Espólio de Valentin carece de legitimidade para pedir a suspensão da presente demanda. Dessa forma, a contradição dos argumentos acabou por importar em afronta ao art. 313, V, “a”, do CPC, desde já prequestionado, pois se suspendeu a demanda com base em prejudicialidade inexistente, devendo haver o acolhimento dos embargos para correção dessa incongruência"; g) "Mesmo considerando que trazer os argumentos de mérito da outra ação para o presente agravo interno configurou inovação recursal, o que deveria resultar na inadmissão do recurso, o Embargante não se furtou de trazer as razões pelos quais tais fundamentos não procederiam, o que também não foi analisado na decisão embargada. 42. Tais teses serão novamente trazidas em sequência, pois o acórdão restou incompleto sem que tenha havido sua apreciação, o que representa direito da parte, que não pode ver negada a jurisdição, consoante disciplina o art. 5º, inciso XXXV, da Constituição Federal, que estabelece que "a lei não excluirá da apreciação do Reclamou: "62. Ante o exposto, requer-se oo recebimento do presente recurso e posterior admissão e provimento para sanar as omissões, obscuridades e contradição apontadas (art. 1.022, I e II, CPC), a fim de que se proceda com a análise integral das teses aventadas nas contrarrazões ao agravo interno e quanto ao erro de premissa cometido por Vossa Excelência na decisão embargada quanto ao objeto da ação n. 5005386- 62.2023.8.24.0005, e, caso haja mudança da conclusão exarada por Vossas Excelências quanto ao ponto, requer a atribuição de efeitos infringentes ao julgamento para negar provimento ao agravo interno, indeferindo o pedido de suspensão do presente processo [...]. Ainda, requer-se o prequestionamento expresso de todas as matérias invocadas, bem como de todos os dispositivos legais mencionados, de modo a possibilitar a ascensão de eventuais recursos aos tribunais superiores" (evento 82, EMBDECL1).
Os embargados se manifestaram no evento 90, CONTRAZ1 e evento 98, CONTRAZ1.
VOTO
1 Admissibilidade
Preenchidos os pressupostos de admissibilidade, os embargos de declaração devem ser conhecidos.
2 Mérito
São oponíveis embargos de declaração quando o pronunciamento judicial apresentar obscuridade, contradição ou omissão, ou erro material, nos termos do artigo 1.022 do Código de Processo Civil de 2015, in verbis:
Art. 1.022. Cabem embargos de declaração contra qualquer decisão judicial para:
I - esclarecer obscuridade ou eliminar contradição;
II - suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento;
III - corrigir erro material.
Parágrafo único. Considera-se omissa a decisão que:
I - deixe de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência aplicável ao caso sob julgamento;
II - incorra em qualquer das condutas descritas no art. 489, § 1º.
Preceitua, ademais, o artigo 489 do mesmo diploma:
Art. 489. São elementos essenciais da sentença:
[...]
§ 1º Não se considera fundamentada qualquer decisão judicial, seja ela interlocutória, sentença ou acórdão, que:
I - se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida;
II - empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso;
III - invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão;
IV - não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador;
V - se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos;
VI - deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento.
Discorre Cássio Scarpinella Bueno:
Recurso de fundamentação vinculada, seu cabimento fica atrelado à alegação de ao menos uma das hipóteses indicadas nos incisos do art. 1.022: (i) esclarecimento de obscuridade ou eliminação de contradição; (ii) supressão de omissão de ponto ou questão sobre o qual o magistrado deveria ter se pronunciado, de ofício ou a requerimento; e (iii) correção de erro material.
A primeira hipótese relaciona-se à intelecção da decisão, aquilo que ela quis dizer, mas que não ficou suficiente claro, devido até mesmo a afirmações inconciliáveis entre si. A obscuridade e a contradição são vícios que devem ser encontrados na própria decisão, sendo descabido pretender confrontar a decisão com elementos a ela externos.
A omissão que justifica a apresentação dos embargos declaratórios, como se verifica do inciso II do art. 1.022, é não só aquela que deriva da falta de manifestação do magistrado de requerimento das partes e de eventuais intervenientes, mas também a ausência de decisão acerca da matéria que, até mesmo de ofício, caberia ao magistrado pronunciar-se. A previsão relaciona-se com o efeito translativo do recurso, a permitir que, mesmo em sede de embargos declaratórios, questões até então não enfrentadas sejam arguidas e decididas. O prévio contraditório, em tais situações, é de rigor.
O parágrafo único do art. 1.022 vai além e estatui que é omissa a decisão que deixar de se manifestar sobre tese firmada em julgamento de casos repetitivos ou em incidente de assunção de competência, que se afirma aplicável ao caso sob julgamento (inciso I) e quando ela deixar de observar as exigências feitas pelo § 1º do art. 489, com relação ao dever de fundamentação das decisões jurisdicionais (Manual de direito processual civil. 3. ed., São Paulo: Saraiva, 2017, p. 735-736).
Na hipótese, sustenta o embargante a existência de omissão no acórdão, ao argumento de que não se teria enfrentado a tese de que o agravo interno inovou ao invocar a probabilidade do direito discutido na ação n. 5005386-62.2023.8.24.0005 sob o fundamento de nulidade da aquisição originária do imóvel. Tal inovação, segundo defende, deveria ter conduzido ao não conhecimento do recurso, nos termos do art. 932, III, do CPC.
A alegação, todavia, não merece guarida.
A questão relativa à prejudicialidade externa, apta a ensejar a suspensão do processo, constitui matéria de ordem pública e, portanto, pode ser reconhecida, inclusive de ofício, pelo julgador, independentemente de provocação das partes.
Com efeito, prescreve o CPC: "Art. 313. Suspende-se o processo: [...] V - Quando a sentença de mérito: a) depender do julgamento de outra causa ou da declaração de existência ou de inexistência de relação jurídica que constitua o objeto principal de outro processo pendente".
Trata-se, portanto, de norma cogente e de observância obrigatória, razão pela qual, verificada a relação de prejudicialidade, ainda que por fundamento não expressamente suscitado pelas partes, impõe-se determinar a suspensão do feito.
De modo que não cabe falar em não conhecimento do recurso por inovação recursal.
Aponta, ainda, o embargante, a existência de obscuridade no acórdão, uma vez que teria utilizado fundamentos estranhos ao pedido original, partindo de premissa equivocada de que a ação anulatória também questionaria a aquisição do imóvel por A. H. P. (pai). Tal equívoco, segundo afirma, gera confusão sobre a extensão dos efeitos da ação conexa e sobre sua própria legitimidade para atuar no processo. Defende também a inexistência de prejudicialidade externa entre as demandas, sustentando que eventual procedência da ação anulatória apenas faria o imóvel retornar ao espólio de Albert pai, hipótese que não afetaria a legitimidade de Albert filho como herdeiro. Assim, o reconhecimento da prejudicialidade afrontaria o disposto no art. 313, V, "a", do CPC.
Penso que não lhe assiste razão.
Não se trata, como aduz o embargante, de utilização de fundamentos estranhos ao pedido original para justificar a existência de prejudicialidade entre as demandas. O acórdão embargado apenas reconheceu a necessária extensão dos efeitos da causa de pedir da ação anulatória – qual seja, a alegada violação à legislação que disciplina a aquisição de imóveis rurais por estrangeiros não residentes no Brasil. Acaso venha a ser acolhida essa tese, o vício apontado comprometeria não apenas a validade da doação, mas quiçá a própria aquisição originária do imóvel pelo doador (como corolário lógico).
Na perspectiva em que se decidiu, não haveria sentido em admitir que o filho, estrangeiro, seja impedido de receber o imóvel por doação, mas possa herdá-lo legitimamente do pai desconsiderando que a vedação à aquisição por estrangeiros – tal como sustentada na anulatória – também contaminaria a aquisição realizada pelo pai.
Entendimento diverso faria incorrer em formalismo excessivo, fomentando a multiplicação de demandas em um Judiciário já sobrecarregado e impondo o ajuizamento de nova ação anulatória, sob idênticos fundamentos, para impugnar a aquisição do bem pelo pai (que, por ser falecido, seria representado pelo filho, este já demandado pelos mesmos motivos), em nítido descompasso com a lógica do sistema jurídico e com os princípios da economia e da eficiência processual.
Por essas razões, mantém-se a conclusão no sentido de que a controvérsia tratada na ação anulatória de ato jurídico (autos nº 5005386-62.2023.8.24.0005) guarda relação de prejudicialidade com a presente demanda, na medida em que objetiva desconstituir o fundamento jurídico que sustenta a pretensão reivindicatória.
Superada essa questão, o embargante ainda alega a existência de contradição em relação a decisões anteriores – tanto em agravo de instrumento (AI n. 5036464-89.2023.8.24.0000) quanto em decisão monocrática – que teriam reconhecido a inocuidade da eventual nulidade da doação em face da aquisição originária. Ressalta, ainda, que a suspensão foi determinada a pedido do Espólio de Valentin, que sequer é parte na ação anulatória, o que reforça a incongruência.
Outra vez sem razão.
A contradição apta a ensejar o acolhimento dos embargos de declaração é a contradição interna, isto é, aquela existente entre os fundamentos e a conclusão da própria decisão embargada, e não eventual divergência com outros julgados. Ademais, ainda que se admitisse a alegada divergência com decisão anterior, o precedente indicado pelo embargante (AI n. 5036464-89.2023.8.24.0000) consiste em decisão provisória, proferida em sede de tutela de urgência que, por sua natureza precária, pode ser revista. Destaque-se, ademais, que, embora não figure como parte na ação anulatória, o espólio de Valentin é diretamente interessado em ambas as demandas, pois foi o alienante do imóvel ao embargado Aujor e já litiga como parte na ação reivindicatória, circunstância que afasta a alegação de incongruência.
Por fim, defende o embargante a plena legalidade da aquisição e da doação, destacando que a compra originária, realizada em 1964, ocorreu antes de qualquer restrição legal a estrangeiros, e que a doação de 1986 foi expressamente autorizada pelo INCRA e registrada em cartório. Acrescenta que as normas posteriores (Lei 5.709/71, Decreto 74.965/74 e Lei 6.739/79) não foram violadas, sendo apenas o INCRA o órgão competente para questionar eventual nulidade.
Sem maiores delongas, tal questão não será objeto de análise nos presentes embargos, por se tratar de matéria de mérito, cuja apreciação compete exclusivamente à magistrada que conduz a ação anulatória.
Enfim, da leitura da petição dos aclaratórios ressai a pretensão de rediscutir matéria já decidida, e que ausentes os pressupostos insculpidos no artigo 1.022 do Código de Processo Civil.
Em verdade, o que se verifica é o intento do embargante de alterar o julgamento por meio de rediscussão, para cuja finalidade não se prestam os aclaratórios.
A propósito: "Não têm os embargos de declaração por objetivo a alteração ou invalidação do julgado, mas apenas o seu esclarecimento ou complementação, sendo inadmissível a rediscussão de questão já decidida" (TJSC, EDcl n. 0301799-57.2014.8.24.0038/50000, rel. Des. Joel Figueira Júnior, j. 6/9/2018).
Também não merece prosperar o pedido de manifestação para fins de prequestionamento, para viabilizar ascensão de recursos aos Tribunais Superiores. A propósito:
I - Em regra, não têm os embargos de declaração por objetivo a alteração ou a invalidação do julgado, mas apenas o seu esclarecimento ou complementação, razão pela qual deve ser desprovido porque objetiva rediscutir matéria já decidida.
II - Ainda que para fins de prequestionamento, necessária se faz a ocorrência de pelo menos um dos vícios elencados no art. 1.022 do novo Código de Processo Civil para o acolhimento dos embargos de declaração opostos, o que não ficou demonstrado no caso em exame (TJSC, Embargos de Declaração nº 0312317-40.2016.8.24.0005, rel. Des. Joel Figueira Júnior, Quarta Câmara de Direito Civil, j. 22/3/2018).
Ademais, "'a falta do prequestionamento explícito não prejudica o exame do recurso especial, uma vez que a jurisprudência pacífica […] admite o prequestionamento implícito' (STJ, AgRg no REsp. n. 1.245.446/CE, rel. Min. Humberto Martins, j. em 24/05/2011). Este o sentido, penso, do artigo 1.025, do Novo Código de Processo Civil" (TJSC, Embargos de Declaração em Agravo (§ 1º art. 557 do CPC) em Apelação Cível nº 2015.085667-8, de Rio do Sul, rel. Des. Henry Petry Junior, j. em 21/3/2016).
Não há necessidade de indicar, numericamente, os artigos ditos violados, desde que se aborde a questão controvertida, para fins de acesso às instâncias superiores. Neste sentido, do STJ:
CIVIL E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO INTERNO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. NEGATIVA DE PRESTAÇÃO JURISDICIONAL. NÃO OCORRÊNCIA. PREQUESTIONAMENTO IMPLÍCITO. POSSIBILIDADE. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS CONVENCIONAIS. REVISÃO. HIPÓTESE LEGAL. AUSÊNCIA. REEXAME DE ELEMENTOS DE FATOS E DE PROVAS DOS AUTOS. DESNECESSIDADE. DECISÃO MANTIDA.
1. Não há falar em negativa de prestação jurisdicional quando a decisão explicita fundamentação suficiente para a solução da lide, demonstrando a violação do dispositivo legal indicado nas razões recursais.
2. Tem-se o prequestionamento implícito quando o órgão julgador, embora não tenha feito menção expressa aos dispositivos legais tidos por violados, emite juízo de valor a respeito da questão jurídica deduzida no recurso especial.
[…]
5. Agravo interno a que se nega provimento (AgInt no Ag. em REsp nº 267.732/SP, rel.: Min. Antônio Carlos Ferreira. J. 18/09/2018).
Deste Tribunal:
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. TENTATIVA DE REDISCUSSÃO DA MATÉRIA. PREQUESTIONAMENTO. INEXISTÊNCIA DOS VÍCIOS ELENCADOS NO ART. 1.022 DO CPC/2015. REJEIÇÃO.
Dentre outros argumentos, foi aduzido nos embargos que deveria haver expressa manifestação sobre os arts. 43, 186, 927, 944 e 955 do CC; arts. 489, § 1º, e 1.022 do CPC; arts. 5º, V e X, e 37, § 6º, da CF e diversos precedentes do STJ e STF.
Só que isso não compôs as razões de apelação, o que não obriga o seu exame, porque a postulação não pode se limitar à menção de dispositivos legais; é preciso situá-los no caso concreto e afirmar, de forma muito clara, sua incidência.
Argumento não é tese retórica, nem mera indicação de texto de lei para que sobre ele o juiz se pronuncie, inclusive em face de prequestionamento. É preciso que a parte explicite o vínculo da norma apontada com o caso concreto, em argumentação articulada e pertinente.
O CPC/2015 traz maiores responsabilidades a todos os atores processuais; se do juiz se exige fundamentação adequada e completa, do advogado se espera postulação igualmente qualificada, que não dá ensejo à imprecisão, à generalidade ou à indeterminação (ED nº 0302589-04.2014.8.24.0018, rel. Des. Paulo Henrique Moritz Martins da Silva, Primeira Câmara de Direito Público, j. 17/12/2019).
Considerando que o acórdão embargado enfrentou e afastou, adequadamente, a matéria prequestionada, inexiste omissão, ainda que nem todos os dispositivos legais suscitados tenham sido mencionados no decisum.
De maneira que se impõe rejeitar os embargos.
3 Dispositivo
Ante o exposto, voto no sentido de conhecer dos embargos de declaração e rejeitá-los.
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EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM Apelação Nº 0018034-24.2007.8.24.0005/SC
RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
EMENTA
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM AGRAVO INTERNO EM APELAÇÃO CÍVEL. ACÓRDÃO QUE RECONHECEU A EXISTÊNCIA DE PREJUDICIALIDADE EXTERNA ENTRE A "AÇÃO REIVINDICATÓRIA C/C ANULAÇÃO DE SENTENÇA, CANCELAMENTO DE REGISTRO IMOBILIÁRIO" E A "AÇÃO ANULATÓRIA DE ATO JURÍDICO" POSTERIORMENTE PROPOSTA.
EMBARGOS OPOSTOS PELO AUTOR DA AÇÃO REIVINDICATÓRIA.
ALEGAÇÃO DE: A) OMISSÃO, SOB O FUNDAMENTO DE QUE O ACÓRDÃO NÃO TERIA ENFRENTADO A TESE DE INOVAÇÃO RECURSAL; B) OBSCURIDADE, AO ARGUMENTO DE QUE A DECISÃO TERIA UTILIZADO FUNDAMENTOS ALHEIOS AO PEDIDO FORMULADO NA AÇÃO ANULATÓRIA; C) CONTRADIÇÃO, PORQUE HAVERIA INCONGRUÊNCIA COM DECISÕES ANTERIORES. TESES RECHAÇADAS. APRECIAÇÃO DAS MATÉRIAS SUSCITADAS DE MODO INTEGRAL, SUFICIENTE E CONGRUENTE. INTENTO DE REDISCUTIR O JULGADO. PREQUESTIONAMENTO. INVIABILIDADE. HIPÓTESES ELENCADAS NO ARTIGO 1.022 DO CPC/2015 NÃO VERIFICADAS.
EMBARGOS CONHECIDOS E REJEITADOS.
ACÓRDÃO
Vistos e relatados estes autos em que são partes as acima indicadas, a Egrégia 4ª Câmara de Direito Civil do decidiu, por unanimidade, conhecer dos embargos de declaração e rejeitá-los, nos termos do relatório, votos e notas de julgamento que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.
Florianópolis, 13 de novembro de 2025.
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Extrato de Ata EXTRATO DE ATA DA SESSÃO ORDINÁRIA FÍSICA DE 13/11/2025
Apelação Nº 0018034-24.2007.8.24.0005/SC
INCIDENTE: EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
RELATOR: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
PRESIDENTE: Desembargador JOSÉ AGENOR DE ARAGÃO
PROCURADOR(A): PAULO CEZAR RAMOS DE OLIVEIRA
PREFERÊNCIA: EDUARDO RIBEIRO por V. A. M. S.
Certifico que este processo foi incluído na Pauta da Sessão Ordinária Física do dia 13/11/2025, na sequência 33, disponibilizada no DJe de 27/10/2025.
Certifico que a 4ª Câmara de Direito Civil, ao apreciar os autos do processo em epígrafe, proferiu a seguinte decisão:
A 4ª CÂMARA DE DIREITO CIVIL DECIDIU, POR UNANIMIDADE, CONHECER DOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO E REJEITÁ-LOS.
RELATOR DO ACÓRDÃO: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
Votante: Desembargador SELSO DE OLIVEIRA
Votante: Desembargadora ERICA LOURENCO DE LIMA FERREIRA
Votante: Desembargador VITORALDO BRIDI
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